27 abril 2008

Um pouco zen por hoje

Eu poderia dizer que a vida e o corpo são um poço de impermanências. "Poço" poderia ser inadequado, por sugerir um líquido imóvel que se amolda na profundeza. Mas, como em um copo ou mesmo na mobilidade de um rio, a água evapora e o que havia ali já não há. Dado isso, evaporamos sem deixar de existir. Sem morrer, somos outra coisa. E isso nem é uma metáfora espiritualista da morte, pois é sobretudo na vida física que tudo se transforma (e justamente as armadilhas da mente, de uma alma doente, é que tentam impedir a transformação). Deixar ir para viver o agora, que é o que vem, que é o que vai.

19 abril 2008

Dar-se enfim

"O prazer é abrir as mãos e deixar escorrer sem avareza o vazio-pleno que se estava encarniçadamente prendendo. E de súbito o sobressalto: ah, abri as mãos e o coração, e não estou perdendo nada! E o susto: acorde pois há o perigo do coração estar livre! Até que se percebe que nesse espraiar-se está o prazer muito perigoso de ser. Mas vem uma segurança estranha: sempre ter-se-á o que gastar. Não ter pois avareza com este vazio-pleno: gastá-lo."

Clarice Lispector. [claro]

02 abril 2008

Sertão com luar...

Um ônibus dos velhos, uma caminhonete, um tuque-tuque. Algo que me levasse, até lentamente, com algum sacolejo mais ao monótono que ao violento, algo que me levasse a um lugar onde o tempo não corresse. Não é retrocesso: é só o desejo de um lugar onde a gente acordasse junto com o sol. E fosse dormir com a lua já bem alta, depois de um dia feito de todos os cheiros e de toda a temperatura da vida, na pele.