06 abril 2006

Vagando no nada...pensando.

A cada dia tenho mais certeza que as distorções são cruciais para manter a sanidade mental. Alimentar fantasias, construir mundos utópicos me parecem, por vezes, nos remeter a uma realidade mais próxima da verdade. É mais ou menos como empurrar uma subjetividade exagerada, os sentidos puros à frente da fila, deixando a racionalidade para trás.
Os gregos antigos utilizavam muito este artifício; suas emoções eram fundamentadas no mito.
Os gregos aceitam mais facilmente algo semelhante ao sonho do que um cientista, por exemplo. A loucura, a fantasia é essencial aos sábios. Todos eles carregam boas doses de loucura. Talvez seja melhor o desprendimento do que a obrigação de mentir segundo convenções sólidas. As próprias verdades são ilusões em potencial. Pascal tem razão quando afirma que, se todas as noites nos viesse o mesmo sonho, ficaríamos tão ocupados com ele como com as coisas que vemos cada dia: “Se um trabalhador manual tivesse certeza de sonhar cada noite, doze horas a fio, que é rei, acredito”, diz Pascal, “que seria tão feliz quanto um rei que todas as noites durante doze horas sonhasse que é um trabalhador manual”.
Sendo assim, a cada instante tudo torna-se possível, como em um sonho.
O próprio homem é propenso a deixar-se enganar, enfeitiçando-se por uma felicidade mentirosa. A fantasia não deixa de funcionar como um refúgio, um escudo para combater a enxurrada de falsas verdades racionalizadas, de conceitos rígidos e limitados. A intuição é mesmo uma indigente neste cotidiano.
Mas tanto o homem racional precisa da intuição, dos sentidos, da arte, como o ser intuitivo necessita da razão para ter certo domínio da vida. Qualidades como a prudência, a regularidade encontram-se no baú da razão e são essenciais para que a vida não se revista de aparências e belezas, e os impulsos não sejam os condutores do futuro.
O homem intuitivo, abstrato tem dificuldades em aprender com a experiência, pois é desprovido da razão. Por este mesmo motivo também sofre com mais freqüência, caindo sempre no mesmo buraco, mas sofre com tamanha irracionalidade que não consegue disfarçar: chora alto, berra, responde aos impulsos. O homem instruído pela experiência se utiliza das máscaras sorridentes, escondendo a dor que corrói, mas que não altera o equilíbrio dos seus traços, do seu caminhar, e assim ele segue, carregando em seu olhar, o chumbo da razão.